1255 visitas - Fonte: Folha de São Paulo
Nada há de errado em denunciar importadores de madeira ilegalmente extraída no Brasil. Organizações não governamentais com frequência usam o recurso da responsabilização pública para desestimular a demanda por produtos oriundos de desmatamento irregular, ou que empreguem trabalhadores em situação degradante.
Dito isso, é imperioso assinalar o ridículo —para não falar do risco diplomático— da ameaça de Jair Bolsonaro de divulgar uma lista de compradores de madeira apreendida pela Polícia Federal. Se a intenção era constranger líderes europeus que o pressionam para conter a devastação da Amazônia, o disparo sairá pela culatra.
A extração não autorizada de madeira não é o principal motor da destruição. Abrir estradas e pátios clandestinos degrada a floresta, verdade, mas o corte raso se faz no interesse de grileiros e pecuaristas associados a toreiros que atuam no início da cadeia predatória.
A extração é seletiva, concentrando-se nas espécies de maior valor comercial. Derrubada a mata, 90% da madeira fica no chão e termina queimada. Dos 10% que seguem para serrarias, talvez a maior parte se destine ao mercado interno, não à exportação.
É diminuto o volume apreendido na operação Arquimedes, da PF, invocada por Bolsonaro. Os 2.400 m³ de madeira ilegal que seguiriam para Alemanha, Bélgica, Dinamarca, França, Itália, Holanda, Portugal e Reino Unido representam mero 0,02% da produção de madeira em tora em 2019.
O presidente favorece a ilegalidade ao impor seguidas desautorizações ao Ibama quando seus agentes incendeiam tratores e caminhões de madeireiros infratores. O presidente do órgão, Eduardo Fortunato Bim, dispensou em fevereiro autorização específica para exportação do produto, facilitando delitos.
A operação Arquimedes desvendou toda uma rede de criminosos, de engenheiros florestais a funcionários públicos, que fraudam documentos para dar aparência de legalidade às cargas de madeireiros clandestinos. A propaganda do Planalto, entretanto, elegeu como bodes expiatórios compradores fora de sua jurisdição.
Assim agindo, Bolsonaro logrará desacreditar ainda mais a disposição e a capacidade do Estado brasileiro de fazer cumprir as próprias normas. De permeio, ajuda a estigmatizar um produto nacional e, pior, reacende picuinhas com a União Europeia, que resiste a um acordo com o Mercosul.
A eleição do democrata Joe Biden nos EUA tornou ainda mais urgente uma reorientação da política ambiental, o que passa pela saída do ministro Ricardo Salles. Bolsonaro, entretanto, prefere a briga cotidiana com a sensatez.
editoriais@grupofolha.com.br
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