PODER PÚBLICO SUBESTIMA O USO DE AÇÕES DE PREVENÇÃO À DENGUE, DIZ CARLOS NEDER

Portal Plantão Brasil
18/5/2015 17:42

PODER PÚBLICO SUBESTIMA O USO DE AÇÕES DE PREVENÇÃO À DENGUE, DIZ CARLOS NEDER

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Jornal GGN - Médico pela USP e mestre em saúde pública pela Unicamp, o deputado estadual Carlos Neder acredita que o poder público está subestimando o uso de mecanismos de comunicação e de educação para prevenção na área da saúde com o intuito de combater doenças infecto-contagiosas como a dengue, motivo de um surto histórico de contaminados no Estado de São Paulo.



Em entrevista ao GGN, Neder sugeriou que municípios, Estado e União tenham uma política integrada e não circunstancial para frear epidemias como esta, e que apostem mais na reformulação do sistema de saúde para atraiar a população para discutir esse tipo de problema com os gestores públicos.



O deputado é autor de um projeto na Assembleia Legislativa paulista que sugere a destinação de ao menos 25% dos recursos utilizados por governadores, prefeitos e presidente em propaganda, para explicar como a população pode ajudar a conter a proliferação de doenças.



Para Neder, não é correta a posição do governo Geraldo Alckmin, de culpar apenas a população pelo crescimento desenfreado da dengue, que já registrou vitimas fatais no Estado.



Leia a entrevista a seguir:



Jornal GGN - Qual a sua avaliação sobre os encaminhamentos feitos pela prefeitura de São Paulo e pelo governo estadual em relação ao combate à dengue? E o que o senhor acha da fala do secretário de Saúde do Estado, David Uip, que declarou que caberia aos municípios paulista ter uma resposta imediata à epidemia?



Carlos Neder - Em primeiro lugar, quero chamar atenção pelo fato de estarmos com sistema de saúde muito voltado a um caráter de atenção assistencial e menos de ações de promoção à saúde e prevenção de doenças. Acho que o grande desafio que temos é buscar um trabalho mais integrado em relação à questão da sustentabilidade e educação para cidadania. Hoje, se discute muita a questão da dengue, mas logo poderemos estar conversando sobre outras zoonoses igualmente importantes, ou doenças infecto-contagiosas.



O primeiro aspecto que quero ressaltar é o papel do poder público. Penso que falta no Brasil ação integrada nos diferentes níveis de governo e integração das políticas públicas, sobretudo aquelas voltadas à informação à população a partir de dados científicos e técnicos, orientados pelo poder público, para que não se instale pânico e para que as pessoas possam ver qual é a sua parte no processo - uma vez que você não consegue impedir epidemia apenas por atuação do poder público. É preciso envolver o conjunto da sociedade.



Nesse sentido, apresentei projeto de lei na Assembleia Legislativa que cria a obrigatoriedade de que pelo menos 25% das verbas gastas com propaganda de presidente, governador e prefeito, sejam aplicadas em ações de educação de saúde. Nós observamos que, com frequência, as propaganda são centradas na figura de governante, para mostrar os prédios que ele vem construindo, os hospitais que ele pretende construir, e na verdade perde-se valor significativo do orçamento do Estado, que poderia estar sendo gasto em ações de saúde, que traria resultado a médio prazo muito mais significativo que a construção desses hospitais.



Dito isto, acho que também é um equívoco, que tenho observado em visitas a vários municípios de São Paulo, prefeitos e vereadores acharem que a criação de um centro de referência em dengue seria a medida mais apropriada quando se tem epidemia instalada. Na verdade, acho que não cuidamos adequadamente do meio ambiente, nós permitimos a proliferação do mosquito, não orientamos adequadamente a população, e acho que seria equívoco centrarmos fogo na prioridade de gastos com hospitais e centros de referências especializados, embora isso importante para o atendimento daqueles que adquiriram a doença.



Nós subestimamos a necessidade de investir fortemente nas ações de promoção [de educação] e prevenção, e cito a estratégia do programa Saúde da Família, que não tem o desenvolvimento que poderia ter tido, ou a expansão das equipes de controle de zoonoses, com trabalho integrado entre os agentes comunitários de saúde, os demais membros do Saúde da Família, na medida em que uma ação articulada deles com a população, no âmbito da atenção básica, faria com que tivéssemos incidência menor desses casos.



GGN - O senhor fala em aumentar os recursos com propaganda para que as pessoas se informem melhor. Mas desde a década de 1990 temos surtos de dengue e as pessoas até sabem explicar o que fazer para evitar isso. Será que não falta outro tipo de estratégia de comunicaçãom ou outros mecanismos, como sobretaxar as pessoas que têm terrenos não construídos (onde o mosquito pode se proliferar)?



Neder - Bom, essas estratégias punitivas estão contempladas. Há quem diga que você só tem resultado quando mexe no bolso do cidadão ou quando dá poder de polícia aos agentes de saúde, mas acho isso um equívoco. Penso que além das informações sobre a doença, precisamos mudar uma cultura. E você não muda uma cultura se não envolve a participação das pessoas.



Penso que temos que transitar o sistema de atenção, esse assistencial de saúde que temos hoje, para um sistema de saúde diferenciado, em que a mobilização da sociedade, a participação dos munícipes, as diferentes formas de envolvimento das pessoas nos debates sobre saúde, educação e meio ambiente, seja imprencidível.



GGN - No caso de hospitais que atendem planos de saúde, há casos de não cumprimento do protocolo em relação à dengue. Diagnosticados, os pacientes ou são enviados para casa ou são encaminhados aos hospitais públicos. Dentro da Assembleia, o que poderia ser feito para obrigar que a rede privada possa cumprir com o protocolo de atendimento?



Neder - Infelizmente, nós não podemos legislar para a iniciativa privada. Entretanto, a concepção moderna de gestão pública obriga gestores a terem olhar para as organizações de iniciativa privada, seja ela filantrópica ou lucrativa. Não é cabível, por exemplo, que o gestor cuide apenas da sua própria rede de atenção. É preciso, então, diálogo com iniciativa privada para que ela cumpra os protocolos estabelecidos pela vigilância sanitária.



Ocorre que temos hoje uma situação que mesmo municípios de médio porte, além dos de grande porte, vem recorrendo crescentemente à modalidade de gestão privada feita por organizações sociais. Temos a gestão privada propriamente dita quando pensamos na assistência média individual de cunho privado, mas temos também modalidade de gestão privada credenciada pelo poder público, que age em nome do poder público, que são as organizações sociais.



O que me preocupa é que, na medida em que delegamos o papel para essas organizações e elas não cumprem o que está estabelecido em protoloco, você fica com responsabilidade, em nome do poder público, pelo que não foi feito - como se fosse inoperância do poder público, mesmo em casos simples, como controle da dengue.



Nós temos, hoje, claramente uma epidemia instalada, mas infelizmente não sabemos até que ponto isso depende da mudança de temperatura - chegada do outono do inverno e se isso voltará com força no verão - e se todas as medidas que deveriam ser tomadas pelas parceiras da rede pública estão sendo tomadas. Porque a rede pública sob responsabilidade da Prefeitura vem atuando a contento, seja fazendo diagnóstico das áreas de maior risco, capacitando equipes, expandindo o atendimento da Saúde da Família ou agindo através dos agentes de zoonoses.



Acho que isso chama atenção para a organização do sistema de saúde, se ele está adequado para evitar que essa ou outras doenças se instale tornando a população insegura diante da capacidade de resposta.



Quero ressaltar a irresponsabilidade do governo do Estado. Não é possível que estimulemos a criação de centros de referência em nome da crise da dengue, ou que joguemos toda a possibilidade de combate para uma vacina eficaz e de larga escala, ou responsabilizar os municípios por uma atividade que também envolve o Estado.



GGN - Quando há o surto de uma doença como a dengue, qual a responsabilidade de cada entre federativo?



Neder - Isso está bem estabelecido no SUS (Sistema Único de Saúde). Não há que se eximir de responsabilidades os estados, a União ou os municípios. O que precisamos é de estratégias articuladas que não podem ser apoiadas no improviso.



Não cabe hoje ação isolada, como a União dizer que é prioridade dela, sem diálogo direto com gestores estaduais. É preciso que o diálogo ocorra nas instâncias do SUS. Ao lado disso, é preciso regionalização cada vez maior da organização do sistema de saúde, porque a doença não se manifesta na mesma proporção e intensidade em todas as regiões do Estado de São Paulo.



Hoje temos mais de 30 bairros em São Paulo em situação de epidemia. Temos que analisar em cada região os fatores que favoreceram à proliferação da doença. Na Zona Norte e Sul, principalmente. Isso traz elementos para evitar que mesmo fenômeno aconteça em outras regiões da cidade.



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