Com 200 mil mortos na pandemia, praia em Santa Catarina não tem orientação para dispersar aglomerações e é causa de preocupação

Portal Plantão Brasil
11/1/2021 12:52

Com 200 mil mortos na pandemia, praia em Santa Catarina não tem orientação para dispersar aglomerações e é causa de preocupação

0 0 0 0

1129 visitas - Fonte: TAB Uol

"Um coco e uma corona, por favor", pede uma moça de biquíni preto, a contrastar com a pele alva. Ela se apoia no balcão do Barraco da Galera, um dos pontos de venda de bebidas da Praia do Rosa, localizada em Imbituba (SC), próximo ao município de Garopaba. A mulher, na faixa dos 30 anos, se inclina para dentro do balcão, desrespeitando o distanciamento social para com os atendentes, que, assim como ela, não usam máscara.







Ela paga em dinheiro, pega a bebida e desce a faixa de areia para se sentar junto dos amigos. Eles estão no Rosa Norte, o epicentro do aglomerado, onde é impossível transitar sem bater em guarda-sóis e tendas, e, sob eles, grupos de quatro a dez pessoas dividem comida, bebida, cigarros e perdigotos.



A praia, que tem chamado atenção dos noticiários por causa das reiteradas aglomerações, é dividida em três partes: Rosa Sul, à direita, Rosa Norte, à esquerda, e Lagoa do Meio, ao centro. Na região sul, transeuntes se mantêm afastados e famílias ficam a cinco metros de distância umas das outras. Mais ao centro, os banhistas jovens e mais sossegados descansam na areia, também com vãos de distância entre si.







A situação muda completamente na ala norte. Ali é reduto dos jovens que preferem viver no universo paralelo da normalidade a ter de lidar com o fato de que, em 7 de janeiro, o Brasil bateu a marca de 200 mil mortos por Covid-19 no Brasil. A reportagem de TAB visitou a praia no dia 2 e no dia 9: houve registros de 2.077 novos casos no primeiro dia, e 3.596 no segundo, só em Santa Catarina. E nenhum desses números parece importar naquele pedaço de areia.



Roda de narguilé



Em rodas de até uma dezena de banhistas, narguilé, maconha ou chimarrão (a praia é bastante frequentada por gaúchos) são passados de mão em mão, de boca em boca. Copos de caipirinha e latinhas de cerveja são cordialmente oferecidos ao próximo.



No dia 2, logo após a virada de ano, jovens que acabavam de tomar ecstasy se beijavam e abraçavam com fluidez e frequência. Naquele dia, homens vestindo cocares dançavam ao redor de cadeiras, a fim de comemorar o fim do traumático 2020.







Na zona norte da praia, os sons conflitam entre si. Em determinado trecho, a música pop de um grupo de cinco amigas lutava para não ser apagada pelo megafunk (batidão catarinense que mistura funk e eletrônico) da barraca ao lado, com 12 pessoas. No meio dessa batalha sonora, uma família — pai, mãe, filho — desistia de pôr música para tocar.



No geral, megafunk vence sempre. O Rosa Norte é definido pelos jovens bêbados pisando na areia ao som do tunts tunts eletrônico e a voz aguda de algum funk remixado. No dia 2, considerado um dos mais muvucados pelos trabalhadores locais, a batida, somada a muita bebida, servia de desculpa para ultrapassar o espaço alheio e até beber um pouco mais, a fim de acompanhar a vibe.



O bombeiro militar Henrique Veridiano Gonçalves, 38, na corporação há nove anos, detalha que em dias de banhistas altamente alcoolizados, a entrada na água fica proibida. Ele conta que não há qualquer orientação para dispersão de aglomerações, tampouco lhes é indicado ligar para a polícia, caso haja pessoas demais. Assim, resta aos bombeiros proteger a si mesmos contra a infecção do Covid-19. Henrique é o único de seu destacamento a já ter pego a doença: sintomas leves, recuperação rápida. Todavia, teme uma reinfecção, e com isso evita ficar sem máscara no expediente, usa as luvas do kit de primeiros socorros e limpa os pés no pano de cloro e álcool estendido nas portas do destacamento.







Entre a crise e a pandemia



A aglomeração dos banhistas também preocupa trabalhadores de barracas. Dois jovens funcionários que preferiram não se identificar revelam a angústia da doença, mas não negam que o período é bom, economicamente. "Tá sendo o melhor verão", explica um deles. "Por ser jovem, não tenho tanto medo da doença, sabe, mas a gente tem família, né?", continua o outro.



Na mesma faixa etária, eles são parecidos: brancos de cabelo escuro, bigode fino e não usam máscara. Justificam a ausência do utensílio de saúde no calor. "Quando o clima tá mais tranquilo, a gente usa a máscara, só que no calor?" Admitem que fazem errado, mas não creem haver muita opção num clima tão quente e com tanto cliente que também não usa o indumentário. "De 200 pessoas, dez usam máscara quando vem falar com a gente."



Alguns metros ao lado, na outra barraca, Yumi Tsukita Damasceno, 38, reforça o espanto com as aglomerações. "Aqui não tem Covid-19. Você anda, vê todo mundo junto e percebe que aqui isso não existe." Ela balança o filho que carrega no colo e continua: "Você tinha que ver o ano-novo, parece que nada está acontecendo. Não conseguia dar um passo na praia." Ela reclama que o público que frequenta a praia teria caído depois que os hotéis baixaram os preços em decorrência da pandemia. Na sua visão, esse público de menor poder aquisitivo seria menos limpo e estaria sujando mais a praia.







Há pouco ou quase nada de lixo espalhado pelos três quilômetros de faixa de areia. Por toda a extensão, tudo que se vê é gente brincando com seus cachorros e jogando frescobol e altinha, o esporte de praia que nasceu no Rio de Janeiro e que tem se espalhado pelo país. Quicando sua bola amarela com os amigos, algumas pessoas parecem absortas, em outro mundo, um em que não há nem Covid-19 nem Praia do Rosa.



Mas nem os donos das bolas amarelas toparam conversar com a reportagem de TAB. Ao serem abordados, banhistas franzem o cenho, entreolham-se e, como quem sabe que está fazendo algo errado, negam o diálogo. Atualmente são 5.637 mortos pela doença em SC, e no fundo todo mundo sabe o peso disso.



Marina*, 34, foi a única pessoa que topou falar, mesmo em anonimato. Turista de Porto Alegre, ela, junto de seus cinco amigos, estava em um ponto deserto da praia. "Cheguei aqui cedo e falei com eles [aponta para uma barraca] para ver como eu podia me instalar sem ter ninguém perto. Morro de medo de aglomeração."







Ela e os pais tiveram Covid-19. Por ter tido sintomas dolorosos, teme a reincidência e evita muvucas. "Saí para caminhar aqui de noite e é incrível: ninguém usa máscara! Para você ter uma noção, viemos à praia de máscara e todo mundo nos olhou estranho, ninguém usa." E se a aglomeração chegar até ela, ela vai embora e volta para a pousada em que se hospedou. Dividida entre o medo da doença e a vontade de relaxar, Marina tenta encontrar o equilíbrio e se proteger até onde dá.



APOIE O PLANTÃO BRASIL - Clique aqui!

Se você quer ajudar na luta contra Bolsonaro e a direita fascista, inscreva-se no canal do Plantão Brasil no YouTube.



O Plantão Brasil é um site independente. Se você quer ajudar na luta contra o golpismo e por um Brasil melhor, compartilhe com seus amigos e em grupos de Facebook e WhatsApp. Quanto mais gente tiver acesso às informações, menos poder terá a manipulação da mídia golpista.


Últimas notícias

Notícias do Flamengo Notícias do Corinthians