A médica Nise Yamaguchi contradisse o diretor da Anvisa e o ex-ministro Mandetta e negou ter pretendido mudar a bula da cloroquina

Portal Plantão Brasil
1/6/2021 16:41

A médica Nise Yamaguchi contradisse o diretor da Anvisa e o ex-ministro Mandetta e negou ter pretendido mudar a bula da cloroquina

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421 visitas - Fonte: O Globo

BRASÍLIA — Em depoimento à CPI da Covid nesta terça-feira, a oncologista e imunologista Nise Yamaguchi negou que tenha participado de encontros privados com o presidente Jair Bolsonaro e reiterou a defesa ao chamado tratamento precoce, com medicamentos de ineficácia comprovada contra a Covid-19. A médica afirmou ainda que não discutiu a mudança na bula da cloroquina para indicar o medicamento para o tratar Covid-19, contrariando os depoimentos do ex-ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, e do presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).







Apesar de negar ter se encontrado com o presidente, a agenda de Bolsonaro, no entanto, registra pelo menos quatro reuniões com a médica, dos quais três com a presença de outras pessoas, e uma a sós.



— Nessa situação, eu entendia que era importante fazermos a ampliação dos tratamentos de acordo com o julgamento dos médicos. (...) Não estou aqui para defender um governo. Estou aqui para defender o povo brasileiro. Isso é baseado em ciência. Sou colaboradora eventual de qualquer governo que precisar de mim.



Nise apresentou uma versão diferente de Mandetta e do presidente da Anvisa sobre um reunião no Palácio do Planalto ocorrida em 6 de abril de 2020, da qual era também participou. Ambos relataram uma minuta de decreto para mudar a bula da cloroquina para incluir a indicação para Covid-19. Barra Torres disse inclusive que Nise comentou esse documento, e ele reagiu dizendo que aquilo não seria possível. A médica, porém, disse que não houve minuta para mudar a bula. Nise afirmou ter pegado uma cópia do documento.







— Eu não fiz nenhuma minuta. Inclusive não conhecia esse papel — disse Nise, acrescentando: — Depois da reunião descobri que eles estavam se referindo a uma minuta, e essa minuta jamais falava de bula. Falava sobre a possibilidade de haver uma disponibilização de medicamento, que deveria ser acordado entre médico e paciente.

Ela também afirmou ter ocorrido perseguição política a médicos que estavam receitando tratamento precoce.ef



Questionada se Mandetta e Barra Torres mentiram, ela disse:



— Não acho que eles tenham mentido. Acho que se equivocaram, que era um decreto da bula. Não era isso.



Diante da resposta de Nise, que negou ter participado de reunião sobre mudança da bula da cloroquina, Omar sugeriu realizar uma acareação com o presidente da Anvisa, Antonio Barra Torres.







Nise disse que teve um encontro com o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, e outro com o ex-secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, Denizar Vianna. Também afirmou se recordar de mais duas reuniões com a secretária de Gestão do Trabalho do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro, conhecida como "Capitã Cloroquina", por ser uma das principais defensores do tratamento precoce.



— Eu fui sozinha, mas tinha mais gente, os assessores dele — afirmou Nise.



Ela negou ter tido encontros ou conhecer o vereador do Rio de Janeiro Carlos Bolsonaro, filho do presidente Jair Bolsonaro. Mas não descartou que, em alguma reunião que tenha contado com muitos participantes no Planalto, ele estivesse presente.



Nise disse conhecer o empresário Carlos Wizard e o ex-assessor especial da Presidência da República Arthur Weintraub, apontados como supostos participantes do "gabinete paralelo", e citou algumas reuniões das quais participou com eles. Mas disse não ter trabalhado com os dois.



Nise reafirmou que atuava como consultora eventual do Ministério da Saúde, sem cargo oficial na pasta. A senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), representante da Bancada Feminina na sessão, indagou se a função não representaria aconselhamento paralelo. A imunologista negou.



Indagada pela senadora se teria se vacinado, Nise disse que não, por sofrer de vasculite, uma doença autoimune.







Confira as reuniões com Bolsonaro:



6 de abril de 2020 — Além de Nise Yamaguchi, estavam o anestesista Luciano Dias Azevedo e o deputados Osmar Terra. Havia a presença de alguns ministros, mas não de Luiz Henrique Mandetta, à época no comando da Saúde.



15 de maio de 2020 — Nise Yamaguchi em reunião a sós com Bolsonaro.



21 de maio de 2020 — Nise Yamaguchi, ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde Elcio Franco, ministro da Casa Civil, Luiz Eduardo Ramos, e ex-prefeito do Rio de Janeiro Marcelo Crivella.



8 de setembro de 2020 - Nise Yamaguchi e integrantes do grupo "Médicos pela Vida", que defende o uso de remédios sem eficácia comprovada contra a Covid-19.







Tratamento precoce



Durante o depoimento, Omar Aziz rebateu a fala em que Nise equiparava tratamento precoce e vacina e disse que ela será reconvocada à CPI, dessa vez não mais como testemunha:



— Vacina sempre preveniu. É melhor prevenir do que remediar. Isso é histórico. (...) Tem que vacinar todos os brasileiros, pelo amor de Deus! Todos os brasileiros precisam de duas vacinas. Duas! Não acreditem nela. A vacina salva!



Nise defendeu o tratamento precoce, mas disse não ser possível quantificar o benefício dele. Renan perguntou por que, mesmo com esses remédios, não houve eficácia para evitar as mortes no Brasil, que já passam de 460 mil.



— Claro que teve eficácia — respondeu Nise.



Renan então perguntou se isso quer dizer que mais gente poderia ter morrido, e ela afirmou:



— E possível que sim. Nós não sabemos. Houve um anúncio inclusive das universidade europeias que teríamos milhões de mortes até abril do ano passado. E na época já estava utilizando nos protocolos do Ministério da Saúde. Então não dá para saber uma medida exata dos medicamentos e tratamentos iniciais.



Ela reclamou dos arranhões à sua imagem em razão da polêmica em torno da cloroquina, e disse que procurou a CPI para esclarecer o tema. Destacou também não ser filiada a partido político. Ao dizer que estava na CPI como perita médica, foi corrigida pelos senadores, que afirmaram que estava na condição de testemunha.







Nise negou integrar um "gabinete paralelo" no governo para aconselhar o presidente Jair Bolsonaro sobre a pandemia



— Eu desconheço um gabinete paralelo, ou que integre um gabinete paralelo. Sou uma colaboradora eventual. Participo como médica, cientista — disse a médica.



Médica Nise Yamaguchi chega ao Senado para depor à CPI da Covid Foto: Pablo Jacob/Agência O Globo



Renan apresentou vídeos antigos em que ela mencionava a imunidade de rebanho e questionou se mantém a posição. Nise disse inicialmente que há um ponto em que, se houver muitas pessoas com anticorpos contra a doença, ocorre a imunidade de rebanho. Afirmou também que, naquele momento, em que não havia novas variantes, essa era uma discussão pertinente. Assim, não mantinha nem mudava de posição. Ela também negou ter tratado desse assunto com Bolsonaro.







Perguntada novamente por Renan sobre o "ministério paralelo", Nise respondeu:



— Eu desconheço a existência de um gabinete paralelo. Eu não teria nem como enunciar pessoas que participem.



Segundo o presidente da Anvisa, Antônio Barra Torres, e o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta, a médica era uma das pessoas presentes durante uma reunião em que se cogitou alterar a bula da cloroquina para incluir a recomendação no uso de combate ao Covid-19.



Questionada por Renan, Yamaguchi evitou responder se apoia o presidente Bolsonaro, de quem é próxima, nas ações de enfrentamento ao novo coronavírus.



— Não estou aqui para apoiar ou desapoiar nenhuma conduta de nenhuma pessoa, porque isso é uma coisa do fórum individual. Eu estou aqui para declarar cientificamente a minha posição e o que as pessoas fazem com a minha posição é de fórum individual — afirmou a imunologista.







Em resposta, o relator mostrou vídeos de Bolsonaro falando “não sou coveiro” e afirmando que quem tomasse vacina se tornaria jacaré.



Renan perguntou sobre a reunião de 15 de maio. Inicialmente ela disse não se recordar, mas depois reiterou que nunca teve um encontro a sós com Bolsonaro. Em seguida, por sugestão do senador de oposição Rogério Carvalho (PT-SE), Renan questionou quantas vezes ela esteve no Ministério da Saúde. Ela afirmou que já foi lá inúmeras vezes em vários governos.



Nise disse que conversou uma vez com Bolsonaro sobre o tratamento precoce, no início da pandemia. Ela afirmou ter dito para ele ser necessário ter dados científicos, e contou ter participado posteriormente de reuniões técnicas sobre o assunto.



Questionada se o tratamento precoce é tão importante como a vacinação, ela disse que são coisas diferentes.



— Uma é para prevenção. A vacina é prevenção. E tratamento é tratamento. Uma coisa é uma coisa, e outra coisa é outras coisa — disse Nise.







Depoimento da ex-secretária de Enfrentamento à Covid-19



A CPI marcou para quarta-feira o depoimento da ex-secretária de Enfrentamento à Covid-19 do Ministério da Saúde, Luana Araújo. Inicialmente, estava prevista uma audiência com médicos para amanhã. Luana, que se opunha ao uso da cloroquina contra a Covid-19, foi demitida poucos dias depois de assumir o posto. O ministro Marcelo Queiroga, que assumiu o cargo no fim de março, se esforça para chamar atenção ao que está sendo feito daqui para frente, mas a demissão de Luana poderá dar à oposição a oportunidade de mostrar que as coisas não mudaram tanto, e que o presidente Jair Bolsonaro continua interferindo no ministério.



O senador governista Marcos Rogério (DEM-RO) criticou a mudança na pauta da reunião de quarta-feira, feita apenas na noite de segunda-feira. O presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), disse que a comissão é dinâmica e defendeu a necessidade de ouvir Luana, em vez de fazer uma audiência para alguns médicos debaterem a cloroquina.



— É muito mais importante que ficar discutindo se cloroquina é bom ou não — disse Omar.







Embasamento científico



Tanto o presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), quanto o relator, Renan Calheiros (MDB-AL), já afirmaram publicamente em entrevistas que há provas que confirmam a existência do “gabinete paralelo”.



Em entrevistas, Yamaguchi mencionou suposta proximidade com o presidente Jair Bolsonaro e interlocução com outras autoridades, como o ex-chanceler Ernesto Araújo, o ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello e a secretária de Gestão do Trabalho e Educação no Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro — os três já depuseram à CPI da Covid.



Copa América no Brasil



Senadores governistas, por sua vez, esperam que a médica apresente posicionamentos científicos para embasar as defesas feitas pelo presidente Bolsonaro e outros integrantes do Executivo sobre o tratamento precoce e o uso da cloroquina.







A Conmebol anunciou na segunda-feira que o Brasil sediaria a Copa América, depois de Colômbia e Argentina. Em meio a alertas de terceira onda de Covid-19 e à chegada de novas cepas, a negociação para trazer o evento ao país foi realizada diretamente com o presidente Jair Bolsonaro.



— Virão delegações de atletas, torcedores, de dirigentes, de gente da imprensa que vem cobrir e isso significa que nós teremos que garantir, além de segurança, leitos hospitalares, atendimento de saúde, coisa que está faltando pra população brasileira nesse momento — disse Humberto Costa (PT-PE).



Parlamentares ingressaram com pedido no STF para barrar a realização do evento no país. Vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP) já protocolou requerimento para chamar o presidente da CBF, Rogério Caboclo, para depor na comissão.



— Realmente é sem lógica fazer agora um evento internacional. Não temos o que comemorar. Temos é que lamentar. Então, naquele primeiro momento, como tivemos campeonatos estaduais, e outros campeonatos aqui... Mas depois, fazendo uma autocrítica e racionando, vamos comemorar o quê? Se for campeão da Copa América, vai mudar o que para a gente? — afirmou Omar Aziz.







— Se por acaso, houver insistência do governo junto com a CBF em trazer de forma equivocada, numa irresponsabilidade sanitária sem precedentes, é importante que, ao contrário de chamar o presidente da CBF, chame o ministro Marcelo Queiroga. Ele tem que dizer: "tenho condições de fazer barreiras sanitárias por terra — declarou Otto Alencar (PSD-BA).



O senador governista Marcos Rogério (DEM-RO) criticou a possibilidade de investigar o episódio envolvendo a Copa América. Ele disse que a CPI tem fatos determinados, ocorridos no passado, para apurar.



O também governista Eduardo Girão (Podemos-CE) defendeu a realização da Copa América.



— Já temos o Campeonato Brasileiro, os campeonatos regionais. A própria Conmebol realiza a [Copa] Sul-Americana no Brasil. Não podemos ter dois pesos e duas medidas — afirmou Girão.



O relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL), também criticou a realização da Copa América no Brasil.



— É inacreditável que o governo federal queira sediar a Copa América no exato momento em que a pandemia se agrava e enche nossos cemitérios, as nossas UTIs. A terceira onda começa a chegar. Seria transformar essa copa em campeonato da morte. Já que não podemos fazer um apelo ao presidente da República, ao ministro da Saúde, à CBF, que tem se transformado em negacionista e até irresponsável, eu queria me direcionar à seleção brasileira, ao Neymar: não concorde com a realização da Copa América no Brasil, não é esse campeonato agora que precisamos disputar. Precisamos disputar o campeonato da vacinação — disse Renan.







Pedido de reconvocação de Wajngarten



O senador Rogério Carvalho (PT-SE) apresentou dados via LAI e pediu para ouvir novamente o ex-secretário de Comunicação da Presidência Fábio Wajngarten, que depôs à CPI após relatar sua participação nas negociações para a compra de vacinas em entrevista à revista Veja.



— A divulgação com vacina, o governo gastou R$ 5 milhões, R$ 19,5 milhões para divulgar o tratamento precoce e R$ 30 milhões para defender a volta ao trabalho, o que mostra claramente que a pandemia foi conduzida no sentido de promover o contágio natural entre os brasileiros e brasileiras e nós estamos colhendo os frutos mais fúnebres, que são as 462 mil mortes.



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