Vice de Roberto Jefferson se diz padre, mas nunca foi sacerdote

Portal Plantão Brasil
19/8/2022 17:41

Vice de Roberto Jefferson se diz padre, mas nunca foi sacerdote

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682 visitas - Fonte: O Globo

O fato de o bolsonarista Roberto Jefferson (PTB) ter se registrado para disputar a Presidência da República mesmo cumprindo prisão domiciliar e respondendo ao inquérito dos atos antidemocráticos no Supremo Tribunal Federal não é a única bizarrice da chapa do PTB.

O candidato a vice-presidente, que levará nas urnas o nome de Padre Kelmon, também é um personagem enrolado sobre o qual pairam suspeitas.


O baiano Kelmon Luís da Silva Souza, de 45 anos, se diz ortodoxo, mas nunca foi sacerdote das igrejas da comunhão ortodoxa no Brasil. Ainda assim, celebra missas e batismos na Bahia e ganhou notoriedade em grupos conservadores graças ao discurso bélico contra a esquerda.

A despeito de suas frágeis credenciais, já foi recebido pelo Arcebispo do Rio de Janeiro, o cardeal Dom Orani Tempesta, participou de convocações para os atos golpistas do 7 de setembro no ano passado na condição de religioso e até recebeu um desagravo da deputada Carla Zambelli (PL-SP) nas redes sociais.

A suposta vinculação com a Igreja Ortodoxa é propagandeada nas em suas redes sociais e no texto que anunciou sua candidatura a vice-presidente no site oficial do PTB.


Kelmon inclusive aparece de batina na foto que deve figurar na urna eletrônica. Segundo o partido, o baiano foi uma escolha pessoal de Roberto Jefferson.

O suposto padre ortodoxo se diz admirador dos falecidos políticos Levy Fidélix e Enéas Carneiro, usa seu canal no YouTube para denunciar a “islamização” e a “perseguição” a cristãos no Brasil e já foi filiado ao PT.

O padre Gregório Teodoro, membro da Arquidiocese de São Paulo e todo o Brasil da Igreja Ortodoxa Antioquina, assegurou à equipe do blog que Kelmon não guarda qualquer conexão com a comunhão ortodoxa, reiterando não ser de hoje que questionamentos ao ordenamento de Kelmon chegam à sua instituição.


“Posso dizer com absoluta certeza que ele não pertence à Igreja Ortodoxa Antioquina e nem a qualquer das igrejas canônicas do antigo patriarcado ortodoxo”, declarou o sacerdote à equipe da coluna por telefone.

“Na legislação brasileira, cumprindo poucos requisitos necessários, pode-se registrar um CNPJ de uma igreja com qualquer nome, em respeito à liberdade de culto e de organização. Daí a ser uma igreja que pertença à comunhão ortodoxa é algo completamente diferente”, explicou Teodoro.

O fato de Kelson nada representar para a comunidade ortodoxa causa espanto, já que o PTB informa no seu site que o baiano foi eleito bispo pelo Santo Sínodo, autoridade suprema da Igreja Ortodoxa, no ano passado.


A informação, porém, não procede, uma vez que a única vinculação conhecida do bispo é com uma controversa instituição que se autoproclama Igreja Católica Apostólica Ortodoxa del Peru.

Trata-se de uma entidade não reconhecida pelas igrejas canônicas do antigo patriarcado ortodoxo, por fazer uso indevido de elementos religiosos e até vestimentas facilmente encontradas na internet.

É o líder dessa igreja, Angel Morel Vidal, quem assina os dois comprovantes de escolaridade entregues por Kelmon ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), alegadamente emitidos em São Paulo. O mais recente, de 2006, refere-se a um bacharelado em teologia. O outro, de 2003, confere o grau de “licenciatura em filosofiando”.


Os dois diplomas trazem informações conflitantes: no mesmo documento, o comprovante é atribuído ao “Mosteiro São Basílio e São Tomé” e ao “Mosteiro São Basílio e Santo Efrém”. Não existem instituições com esse nome na capital paulista.

Os dois documentos também carregam o emblema da igreja peruana, ao lado do brasão da República brasileira.

Ainda assim, a despeito das frágeis credenciais, Kelmon conseguiu ser recebido por uma importante autoridade religiosa: o Arcebispo do Rio de Janeiro, Dom Orani Tempesta, que também é cardeal da Igreja Católica.


A página da “Arquidiocese Siro Ortodoxa Malankara da Diáspora” publicou fotos do petebista com Dom Orani no dia 22 de junho, quando Kelmon ainda não era candidato a vice-presidente. A igreja peruana se diz ligada à vertente ortodoxa Malankara, mas não existe um braço da Igreja na América do Sul.

A legenda descreve o encontro como uma “visita ecumênica”. Indagada sobre a natureza do encontro, a Arquidiocese do Rio não respondeu até o fechamento do texto.

A mesma página publicou, no último dia 6, um comunicado de Morel Vidal felicitando Kelmon pela indicação para a vice na chapa de Jefferson e liberando seu integrante para fazer campanha.


“Ressaltamos que a Igreja oficialmente não atua em um partido político, porém, a Igreja está vigilante a valores que não abrimos mão, sendo eles Deus, Pátria, Família, Liberdade, Vida (sic) desde a concepção”, diz o comunicado, repetindo o slogan do PTB – que, por sua vez, alude ao lema do Integralismo brasileiro.

No canal de Kelmon no YouTube, que também reproduz conteúdos de extrema-direita, o candidato a vice-presidente aparece vestindo indumentárias religiosas típicas da ortodoxia e celebrando missas na Ilha da Maré, uma região carente de Salvador que fica na Baía de Todos os Santos.

Num dos vídeos, publicado em 2021, ele recebe Roberto Jefferson no local. De acordo com o site do PTB, a visita ocorreu em 2020, antes da prisão do ex-deputado condenado no mensalão. Kelmon também gravou convocações para os atos golpistas do 7 de setembro do ano passado.


O baiano também se utilizou do título de padre ortodoxo para arrecadar fundos para a construção de uma paróquia dedicada a São Lázaro na região, além do acolhimento de refugiados venezuelanos.

Kelmon também é presidente da Associação Theotokos (Mãe de Deus em grego), que se define como uma “organização religiosa ou filosófica” nos cadastros da Receita Federal.

Ele aparece como único sócio do CNPJ da entidade. O endereço registrado corresponde na realidade a um supermercado atacadista na Zona Sul de São Paulo.

No Instagram da associação, Kelmon aparece batizando uma criança. Em outra foto, de 2018, ele posa ao lado do jurista Ives Gandra Martins, um dos ídolos do bolsonarismo. Há várias publicações contrárias ao aborto.


Em 2021, antes de Kelmon entrar na corrida presidencial, denúncias sobre a falsa ligação do padre com a igreja Ortodoxa foram publicadas no site de notícias baiano Farol da Bahia.

Embora faça propaganda dessa suposta ligação com a igreja Ortodoxa, o site do PTB omite da biografia do vice de Roberto Jeffrerson uma passagem importante de sua militância partidária.

Ele se filiou ao PT às vésperas da primeira eleição de Lula, em junho de 2002. Segundo o arquivo do TSE, seu vínculo foi extinto em 2009. No ano seguinte, o baiano se envolveria em um episódio polêmico e ruidoso na campanha presidencial de José Serra (PSDB) em 2010.


Na ocasião, quando o termo “fake news” sequer era usado no cotidiano, a Polícia Federal apreendeu dois milhões de panfletos que ligavam a então candidata Dilma Rousseff (PT) à defesa do aborto e a posições contrárias à Igreja por determinação do TSE.

Conforme a grande imprensa reportou à época, a operação ocorreu em uma gráfica paulista ligada ao núcleo duro da campanha tucana. O episódio teve impacto considerável na campanha de Dilma, que depois venceu Serra no segundo turno.


Na ocasião, vários veículos publicaram reportagens indicando que Kelmon encomendou os panfletos a pedido do então bispo de Arquidiocese de Guarulhos e mediou a distribuição do material em igrejas.

Segundo pessoas ouvidas pela equipe da coluna que já conviveram com Kelmon, na época ele vivia na capital paulista.

Nós procuramos a assessoria do PTB para comentar as incongruências da biografia de Kelmon, mas não recebemos retorno até o fechamento deste texto. Também telefonamos para o celular registrado pelo baiano junto ao cadastro de sua associação na Receita Federal, mas não tivemos retorno.

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