1809 visitas - Fonte: Folha de São Paulo
SÃO PAULO - Uma ala do PSOL lançará nesta segunda-feira (10) a pré-candidatura do deputado federal Glauber Braga (RJ) à Presidência da República, ampliando a crise interna na legenda, que se divide entre apresentar um nome próprio nas eleições de 2022 e defender o apoio ao ex-presidente Lula (PT).
A deputada federal Luiza Erundina (SP) é uma das signatárias de um manifesto pró-Braga, o que a distancia —pelo menos no debate sobre a corrida ao Planalto— do ex-presidenciável Guilherme Boulos, de quem a veterana parlamentar foi vice na disputa pela Prefeitura de São Paulo em 2020.
Boulos, que chegou ao segundo turno contra Bruno Covas (PSDB), mas foi derrotado pelo candidato à reeleição, vem defendendo a união da esquerda no pleito do ano que vem e é tido como favorável a um apoio do PSOL a Lula, embora evite antecipar essa discussão em público.
Como mostrou a Folha em março, o líder de movimentos de moradia buscou ampliar seu espaço dentro da sigla com a criação de uma corrente partidária própria. Boulos e o presidente nacional da legenda, Juliano Medeiros, compõem a ala majoritária do partido, que sinaliza avançar na aliança com o PT.
O ex-presidenciável anunciou no mês passado que está disposto a concorrer ao Governo de São Paulo, afastando-se da previsão de que tentaria a Presidência, como fez em 2018. Boulos, que é aliado político e amigo de Lula, era dado como certo na disputa nacional antes da reabilitação eleitoral do petista.
A eventual adesão à candidatura do PT sofre resistência de filiados do PSOL que rejeitam a composição com partidos de centro-direita e do centrão que têm sido procurados por Lula. Em seu esforço para se vender como uma opção moderada, o petista admite dialogar com forças liberais e conservadoras.
Surgido como dissidência do PT, o PSOL fez oposição aos governos Lula e Dilma Rousseff. Desde sua fundação, em 2004, a legenda disputou todas as eleições nacionais, com Heloísa Helena (2006), Plínio de Arruda Sampaio (2010), Luciana Genro (2014) e Boulos (2018).
O manifesto, que une Erundina e outros filiados mais próximos de uma visão socialista, afirma que Glauber Braga é o representante da sigla que pode sustentar debates "caros à esquerda e à sociedade brasileira" diante da crise vivida sob o governo de Jair Bolsonaro (sem partido).
"Devemos aprofundar o debate de programa com uma agenda de discussão que organize as diretrizes do nosso ’programa/projeto’", diz o texto, que foi obtido pela Folha e deverá ser divulgado nesta segunda à noite. Na carta, são citados como eixos desejáveis "derrotar o rentismo e o neoliberalismo", combater "o modelo concentrador de terras e de destruição ambiental" e defender o serviço público.
Braga é descrito no documento como "parlamentar expressivo das bancadas de oposição no Congresso" que pode representantar o campo progressista, "em diálogo a ser estabelecido com outras forças políticas da oposição de esquerda ao governo Bolsonaro", o que exclui a aproximação com a direita.
Os deputados federais Sâmia Bomfim (SP), David Miranda (RJ), Fernanda Melchionna (RS) e Vivi Reis (PA) também endossaram o manifesto. Com isso, a costura em apoio a Braga é ratificada por seis dos dez parlamentares da legenda na Câmara.
Talíria Petrone (RJ), que é líder da bancada e não assinou o documento, criticou o anúncio da pré-candidatura. A deputada disse em uma rede social que, embora seja direito do colega, o lançamento é precipitado no atual cenário, com "um neofascista e ultraliberal no poder e em plena pandemia".
"A derrota de Bolsonaro passa pela unidade, e não pela fragmentação. A prioridade em 2021 não pode ser a eleição de 2022. O PSOL neste ano deve priorizar a luta por vacina, comida e moradia para o povo e a luta pelo impeachment de Bolsonaro", afirmou Talíria.
Segundo os organizadores, a articulação pró-Braga conta com mais de mil adesões. A iniciativa teve ainda o apoio de fundadores do partido, como a deputada estadual Luciana Genro (RS) e o jornalista Milton Temer, e de parlamentares psolistas em Câmaras Municipais e Assembleias de vários estados.
Dirigentes regionais, militantes e ao menos 16 integrantes da direção nacional do PSOL também assinaram.
Boulos tem sustentado um discurso semelhante ao de Lula e outros líderes da esquerda no sentido de que a discussão sobre alianças e candidaturas deve ocorrer mais adiante, e que primeiro é preciso unir forças para contornar as consequências da pandemia de Covid-19 e do desemprego.
"A eleição pode ser discutida, mas não pode ser prioridade agora, com milhares de mortes diárias e tantos desafios", disse o psolista à Folha em abril. Procurado via assessoria nesta segunda, Boulos informou que não comentará a questão até o congresso geral do PSOL, que definirá a posição oficial da sigla.
Em um encontro realizado em março, o partido oficializou a orientação de que qualquer debate sobre o processo eleitoral está interditado até a assembleia nacional, prevista para setembro deste ano.
"Aceito a empreitada e me coloco à disposição para essa tarefa, que obviamente ainda tem que ser debatida nas instâncias do partido", afirma Glauber à Folha. Para ele, o PSOL precisa ter pré-candidato à Presidência e deve evitar que as tratativas eleitorais sejam postergadas para 2022.
Segundo o parlamentar, um dos objetivos do movimento em torno de sua pré-candidatura é "a apresentação de um programa público que não tenha medo de dizer que é de esquerda".
"Não cabe na nossa mesa a direita liberal que se fantasia de centro, como [João] Doria, [Luciano] Huck, [Sergio] Moro e [Rodrigo] Maia", diz, citando pré-candidatos e outros atores políticos que defendem a construção de uma alternativa à virtual polarização entre Bolsonaro e Lula.
É possível defender unidade na esquerda contra bolsonaro e ao mesmo tempo ser pré-candidato a presidente do Brasil pelo PSOL apresentando o programa da esquerda radical de forma não sectária? SIM! Muito obrigado às correntes e militantes que me incentivaram pra essa tarefa. Topo!
— Glauber Braga (@Glauber_Braga) May 10, 2021